13 de novembro de 2011

Horários alterados: fusão e extinção de disciplinas em análise

Ministério da Educação e Ciência está a estudar a possibilidade de retirar a disciplina de Tecnologias da Informação e Comunicação do currículo do 9.º ano e separar Educação Visual e Tecnológica em duas. As hipóteses são contestadas pela raiz e a fusão de História e Geografia volta a surgir.                                                Sara R. Oliveira | 2011-11-04

Os alunos do 9.º ano poderão deixar de ter a disciplina de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) no horário e a matéria de Educação Visual e Tecnológica (EVT) poderá desdobrar-se em duas. Estas possibilidades estão em análise no Ministério da Educação. Nuno Crato revelou que as hipóteses já estão em cima da mesa. No primeiro caso, o ministro usa o argumento de que a maioria dos jovens do 9.º ano domina os computadores e, portanto, torna-se "questionável" que a disciplina faça sentido no último ano do 3.º ciclo. No segundo caso, Crato alega que, neste momento, o país não tem condições para suportar dois professores na mesma sala. E tudo pode mudar.

A Associação Nacional de Professores de Informática (ANPI) ficou "perplexa" quando leu a entrevista do ministro e não tardou a pedir uma audiência à tutela. A ANPI tem vindo a defender, em todo o caso, que a TIC deve sair do 9.º ano e passar para o 7.º e 5.º anos de escolaridade, ou seja, para o início do 2.º e 3.º ciclos. "Acabar, pura e simplesmente, com a disciplina é ridículo", refere António Ramos, presidente da ANPI ao EDUCARE.PT.

A justificação de Nuno Crato de que os alunos do 9.º ano já sabem mexer nos computadores não caiu bem. "É uma afirmação que só demonstra falta de informação de quem deu essa informação ao senhor ministro", afirma. António Ramos adianta, a propósito, que os estudantes do 9.º ano sabem mexer no Facebook, mas nem sempre conseguem tirar o máximo de rentabilidade do computador, além de saber como lidar com as questões de segurança quando navegam na internet. A ANPI vai insistir para ser recebida por Nuno Crato e continua a trabalhar internamente na elaboração de várias propostas.

Separar curricularmente a Educação Visual e a Educação Tecnológica e colocar os docentes a alternarem a docência são ideias que passam pela cabeça de Nuno Crato. Os professores de EVT andam com o coração nas mãos desde o tempo de Isabel Alçada, a partir do momento em que foi colocada em causa a presença de dois docentes na mesma aula a lecionar a mesma disciplina. Os professores de EVT insistem em ser recebidos por Nuno Crato para esclarecer alguns aspetos. "Se o ministro diz que há uma dispersão curricular, como é que acaba com uma disciplina e cria duas?", questiona José Alberto Rodrigues, presidente da Associação dos Professores de Educação Visual e Tecnológica (APEVT), que contesta uma divisão semestral até por causa das idades das crianças do 2.º ciclo do Ensino Básico.

A fusão de História e Geografia no 2.º e 3.º ciclos não é um assunto adormecido e acaba de despertar numa altura em que os cortes no setor educativo têm estado na ordem do dia. A anterior ministra da Educação tinha falado nas duas disciplinas precisamente como um exemplo de áreas curriculares que poderiam passar a semestrais, no âmbito da revisão curricular. Nessa altura, os docentes não colocaram de lado a hipótese das cadeiras semestrais desde que essa medida não implicasse a redução da carga horária. O tema poderá voltar a entrar na agenda do Ministério.

Dúvidas e preocupações A Federação Nacional da Educação (FNE) olha com apreensão para esta revisão curricular, sobretudo se as decisões se apoiarem numa visão economicista, e defende que deve ser feito um amplo debate para analisar qual o melhor caminho a seguir. A FNE espera que as mudanças não sejam feitas de forma apressada, em cima do joelho, e que a qualidade de ensino esteja sempre presente em qualquer alteração. "São medidas em estudo, mas parecem-nos de consequências negativas. Queremos conhecer o restante contexto, mas é claro que nos suscitam muitas dúvidas e preocupações da forma como estão enunciadas", referiu, à Lusa, João Dias da Silva, secretário-geral da FNE.

Para a Federação Nacional dos Professores (FENPROF), as mudanças nas disciplinas são mais um exercício economicista da tutela para chegar a uma poupança de 102 milhões de euros, conforme previsto no Orçamento do Estado para o próximo ano no setor da Educação. Mário Nogueira, secretário-geral da FENPROF, acusa o ministro de se comportar como "um secretário de Estado do Orçamento com funções na área da Educação" e de não ter qualquer ideia do que é a reorganização curricular. "Do ponto de vista da poupança, cortar na Informática são trocos. Não são assim tantos os professores que existem na área da Informática. Estamos a falar de uma hora e meia por semana no 9.º ano", referiu à Lusa. "A aposta na Informática e nas TIC curiosamente até é uma aposta do PSD no tempo do ministro David Justino. Foi nesta altura que as salas de aulas foram equipadas e que a Informática passou a ser obrigatória para o 9.º ano", recordou.

A justificação dada pelo ministro Nuno Crato também não convence Mário Nogueira. "Se calhar muitos alunos não precisam de Português porque sabem ler e escrever. Os jovens dominam bem a Informática nas idas à internet, nos jogos de computador de uma forma desorganizada. A disciplina tem importância porque pode ajudar os jovens a saberem organizar o seu trabalho e a organizar-se com as novas tecnologias", sustenta. A FENPROF está preocupada com esta reforma curricular. "Por razões de ordem financeira estão a empobrecer os currículos, a degradar a qualidade do ensino. É necessária uma reorganização curricular mas não é assim que se faz", avisa o secretário-geral.

A Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP) quer que o ministro da Educação esclareça o que vai ser feito, em concreto, na revisão curricular, lembrando, a propósito, que o programa do Governo prevê um debate nacional sobre a matéria. É isso que a CONFAP acha necessário fazer o quanto antes. Para Albino Almeida, presidente da CONFAP, não se pode separar ou agregar disciplinas conforme os governos em funções. O responsável até concorda que os alunos do 9.º ano já tenham conhecimentos de Informática, mas a questão está em saber quais são as intenções do Governo: se eliminar a disciplina de TIC ou colocá-la no 1.º ou 2.º ciclos.

A Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação (CNIPEE) defende que as TIC devem sair do horário do 9.º ano e passar para o início do 2.º ciclo, para o 5.º ano. "Os jovens sabem manusear perfeitamente um computador. Começam a ter contacto com os computadores muito cedo, logo com o Magalhães. Fazia mais sentido colocá-la no início do 2.º ciclo", sustentou, à Lusa, Maria José Viseu, presidente da CNIPEE.

O PS ficou perplexo com as palavras de Nuno Crato e acusa-o de não ter uma ideia global para a política de educação. "A instabilidade decorre do concurso para a colocação de professores ou da apregoada reforma curricular, que se baseia em medidas meramente avulsas, como a extinção da disciplina de TIC", referiu o deputado socialista Acácio Pinto, coordenador do grupo parlamentar do PS para as questões da Educação. E acusa: "As medidas que estão a ser tomadas não traduzem minimamente uma ideia para a educação em Portugal".

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