4 de dezembro de 2013

OCDE destaca as melhorias alcançadas pelos alunos portugueses

Por que melhoraram os alunos de 15 anos? OCDE destaca avaliação de professores e reforma curricular


Depois dos maus resultados no primeiro PISA, muito mudou em Portugal. Nasceu o Estudo Acompanhado e a Área Projecto, que entretanto foram extintos, e alargou-se a acção social escolar, por exemplo. Mas o estatuto socioeconómico continua a pesar muito no sucesso das crianças.
Os alunos de 15 anos que frequentaram o pré-escolar saem-se melhor nos testes de literacia. E Portugal aumentou o nível de pré-escolarização na última década. As habilitações das famílias estão fortemente ligadas aos resultados dos jovens. E, em Portugal, a percentagem da população adulta com o ensino secundário subiu. E qual terá sido o papel da reforma curricular introduzida no país — uma reforma que "melhora a atitude dos alunos" em relação "à escola, em geral, e à Matemática, em particular"? Ou de medidas como a introdução de áreas não disciplinares como o Estudo Acompanhado, que entretanto deixou de existir? Certo é que os resultados dos alunos portugueses melhoraram.

 

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) passa em revista um conjunto de medidas de política educativa adoptadas por Portugal nos últimos 10, 12 anos. E faz essa análise nos diferentes relatórios ontem divulgados com os resultados do PISA 2012, um mega-estudo internacional que avalia a literacia matemática, Científica e de Leitura dos alunos de 15 anos (ver texto nestas páginas).
A OCDE destaca as melhorias alcançadas pelos alunos portugueses. E a Matemática é a grande responsável. Em 2003, lembra, uma avaliação semelhante àquela que agora foi repetida colocava Portugal abaixo do Luxemburgo, dos Estados Unidos, da República Checa, da França, da Suécia, da Hungria, da Espanha, da Islândia, da Noruega... Em 2012, Portugal "alcançou-os".
Os alunos portugueses colocaram o país no 23.º lugar do ranking da OCDE, com uma média de 487 pontos. A média da OCDE é 494 pontos. Portugal está a sete pontos de distância. Em 2009, era 26.º, com 487 pontos. Mas estava mais distante da média internacional (nove pontos de diferença).
O país faz parte do grupo dos que registam progressos a Matemática superiores a 2,5 pontos ao ano, desde 2003. E as coisas também não correm mal noutras áreas. "O que mostra que mesmo num curto lapso de tempo é possível melhorar de forma abrangente", diz a OCDE.
Já a Comissão Europeia, numa análise aos resultados do PISA, diz que persistem "profundas desigualdades" em alguns países, entre os quais Portugal, com os alunos mais pobres a obter resultados muito mais fracos do que os de estatuto socioeconómico mais elevado.
O secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário, João Grancho, diz que é preciso analisar melhor os números. Ainda assim, ontem, numa apresentação dos resultados, em Lisboa, defendeu que o país está "no bom caminho". Mas que deve ambicionar "estar no grupo da frente", ou seja, junto aos países asiáticos, que em 2012 voltam a dominar os rankings do PISA.
Os receios dos professores
A Associação de Professores de Matemática saúda as melhorias nos resultados alcançados pelos alunos portugueses, mas teme que o novo programa de Matemática, que entrou em vigor este ano no ensino básico, venha a inverter essa tendência. Um receio que não é partilhado pela Sociedade Portuguesa de Matemática, que tem esperança que o país melhore, graças, precisamente, aos novos programas – está em discussão um novo para o secundário.
A OCDE não estabelece relações de causa-efeito. Mas analisa o que se passou na última década. Portugal, por exemplo, começou a reflectir sobre os resultados dos seus alunos depois de em 2000, primeiro ano do PISA, ficar no fim da tabela da literacia, lê-se num dos relatórios da OCDE.
Desde então, continua, muita coisa aconteceu: aumentou a preocupação de identificar os alunos que potencialmente teriam insucesso ou corriam o risco de abandonar a escola para os envolver em projectos de apoio individualizado; os quadros electrónicos e a banda larga chegaram aos estabelecimentos de ensino e nasceram áreas não disciplinares (que entretanto foram eliminadas) como a Área Projecto, o Estudo Acompanhado e a Educação para a Cidadania. Além disso, foi alargada a acção social escolar – entre 2005 e 2009 o número de beneficiários destas medidas triplicou.
E prossegue a OCDE: o problema do absentismo dos professores foi atacado com a criação das famosas aulas de substituição – que entretanto desapareceram na maioria das escolas. E foi feito um investimento forte na formação dos docentes de Matemática, Língua Portuguesa e Tecnologias de Informação e Comunicação.
O papel dos exames
Recordado é ainda o contestado modelo de avaliação dos professores – mas o que é certo é que a avaliação passou a fazer parte do léxico das escolas. Por isso, e não só. As provas de aferição introduzidas nos 4.º e 6.º anos e os exames nacionais no final do 9.º ano habituaram os alunos a responderem sob pressão – em 2013, as provas de aferição foram substituídas por exames –, e isso pode ter contribuído para o facto de os alunos que responderam ao PISA em 2012 estarem mais autoconfiantes e terem mais certezas do que os seus colegas de 2003.
A partir de 2006 os resultados do PISA, que é feito de três em três anos, começaram a melhorar. A diferentes níveis. Portugal é um dos países que conseguiram, simultaneamente, duas coisas: reduzir o universo dos alunos que se saem muito mal neste tipo de testes de literacia e aumentar o número dos jovens que se destacam muito pelo positiva (os chamados "top performers"). Isto aconteceu tanto na Matemática, como nas Ciências, nota a OCDE.
Em 2003, 30% dos alunos portugueses estavam nos patamares mais baixos de literacia matemática (nível 2 ou menos numa escala que vai até 6); em 2012, a percentagem foi de 24,9% . Ao mesmo tempo, 10,6% dos alunos conseguiram ficar no nível 5 ou mais, contra apenas 5,4% em 2003. Esta evolução teve lugar, sobretudo, no período compreendido entre 2006 e 2009, sublinha o relatório.
Chumbar não ajuda
Mas também há más notícias. Um relatório da Comissão Europeia, divulgado horas depois do PISA, faz uma interpretação dos resultados destes testes. Segundo a Comissão, a avaliação demonstra que na União Europeia o estatuto socioeconómico dos alunos tem uma incidência significativa sobre os níveis de desempenho dos jovens.
A Comissão foi ver como se saem os alunos que estão no grupo mais desfavorecido (nos 25% mais desfavorecidos segundo o índice socioeconómico construído pelos peritos do PISA) e os que pertencem a famílias com mais recursos (os 25% mais favorecidos). E a diferença nas pontuações obtidas a Matemática é particularmente significativa (100 pontos ou mais) em oito países da União, entre os quais Portugal, França, República Checa e Alemanha. Isto mostra, diz a Comissão, "as profundas desigualdades que subsistem nos sistemas educativos".
Os dados recolhidos pelo PISA 2012 também demonstram que chumbar não faz ninguém melhorar. E que, apesar de entre 2004 e 2009 a taxa de retenção no final do ensino básico ter descido de 21,5% para 12,8%, ela continua acima da média da OCDE.
O próprio secretário de Estado João Grancho admitiu que subsiste em Portugal um conjunto de jovens "com percursos persistentes de insucesso". Números do PISA: num percurso normal escolar, os alunos de 15 anos devem andar no 10.º ano de escolaridade; da amostra dos mais de 5700 portugueses que fizeram os testes PISA, os que de facto estão no 10.º conseguem uma média de 536 pontos nos testes de literacia matemática; já os alunos que ainda estão no 7.º ano, porque chumbaram, não ultrapassam os 358 pontos, quando sujeitos aos mesmos testes. Os resultados destes alunos (os que acumulam insucesso) são ainda piores do que em 2009.

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